19 de nov. de 2015

Galera entre letras: O Gato no Telhado e a Vaca no Brejo



Pois é. Eu falei pra vocês que esta semana o assunto ia ser o gato no telhado, mas pra fazer companhia ao bichano acabei chamando uma vaca!

Eu sei. A essa altura vocês devem achar que eu enlouqueci! Nada disso. O assunto é sério –- porque tradução SEMPRE é coisa séria, gente!

Eu acho que vocês nunca pararam pra pensar em quantas expressões no nosso idioma têm animais como seus protagonistas. Vejam só: deu zebra, cada macaco no seu galho, tirar o cavalo da chuva etc.
E cada expressão dessas tem um sentido bem definido. Quando dizemos, por exemplo, que “o gato subiu no telhado”, é pra avisar que vem notícia ruim pela frente ou mesmo que uma situação desagradável é inevitável, e se “a vaca foi pro brejo”, a coisa ficou feia mesmo e tempos difíceis vêm pela frente.

Mas nem sempre é fácil adaptar essas expressões para outros idiomas (e o inverso também é verdade). Imaginem, por exemplo, se a gente traduzir “a vaca foi pro brejo” literalmente — e um importante autor e tradutor brasileiro, Millôr Fernandes, fez isso por brincadeira; ficaria “the cow went to the swamp” e, para os falantes de língua inglesa, significaria apenas isso: uma vaca indo pro brejo — provavelmente, o animal ficaria atolado e precisaria de resgate. O sentido original da frase se perderia.

A melhor maneira de dizer que algo não está bem, que uma situação ruim é prevista, em inglês — e, ao mesmo tempo, manter ainda a referência a algum bichinho — é dizer que a situação “is going to the dogs”.

Se alguma coisa “vai ficar com os cachorros”, em inglês, já é considerada caso perdido. Aqui tem a explicação pra essa curiosa frase (que se originou na China antiga, vejam só!).

Outro dia eu me vi às voltas com a expressão “X has put Y out to pasture” num contexto mais ou menos negativo (alguém falava que não sabia se o produto Y tinha sido abandonado pela empresa X) e aí eu fiquei pensando como poderia passar essa ideia negativa contida na expressão que, literalmente, quer dizer: “X mandou Y pastar.”

E havia outro problema: em português, a gente usa a expressão “vai pastar!” quando chama outra pessoa de “burra” (justamente porque o que ruminantes fazem é pastar), portanto, a tradução literal estava fora de questão.

Eu tentei usar várias opções antes de “o gato subiu no telhado”, mas nenhuma se encaixou e a frase final ficou assim: “o gato de Y subiu no telhado de X”.

Nem sempre a gente encontra a maneira perfeita de transpor a ideia original para o nosso idioma, mas o importante é dar a chance ao leitor de tentar formar o sentido do que está escrito ali.

Por hoje é só. Leiam bastante e até!

Aviso importante: nenhum animal foi ferido durante a elaboração da coluna de hoje.

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