27 de nov. de 2015

Papos de Sexta: Paris e o amor


Eu sempre sonhei conhecer Paris. Aquela torre famosa, o arco gigante, as pessoas falando a língua que acho a mais linda do mundo, todas as recordações das centenas de filmes franceses que assisti, todos os lugares das dezenas de livros com a cidade como cenário... Incrivelmente realizei esse meu imenso sonho esse mês. Casei e, como presente de casamento, tive a felicidade de conhecer o lugar que tanto queria ao lado do meu marido.

Passei 4 dias incríveis na cidade e não vi a grosseria que algumas pessoas relataram viver quando pisaram lá não falando o francês. Andei o dia todo pelas ruas de meus sonhos e tirei menos fotos que meu normal porque queria sentir a cidade, queria que aquele ar da Cidade Luz me tomasse. Queria sentar no banco em frente ao rio Sena, queria encostar na ponte de cadeados, ver o dia escurecendo e o letreiro do Moulin Rouge acendendo, eu não queria dormir porque para mim, repito, eu estava sonhando.

Claro que queria mais dias, gostaria de ter passado alguns meses, mas, no pouco tempo que ali fiquei, reparei em tudo: na cordialidade dos franceses, na elegância das pessoas e até nos defeitos (odeio cigarro e eles fumam muito!). Amo meu Rio, mas Paris é incrível também.

Saí de lá para Madri — nossa próxima parada da lua de mel — no dia 13 de novembro. Passei a manhã na cidade que a poucas horas sofreria um terrível atentado, e me despedi de Paris obviamente sem imaginar a tristeza que a cidade, que nos acolheu tão bem, passaria.

No hotel, já na Espanha, me deparei com amigos e familiares preocupados conosco, pois as TVs mostravam o que tinha acontecido naquela noite: enquanto eu curtia e celebrava o casamento, mais de 100 pessoas morriam na cidade que havia acabado de me conquistar ainda mais.

Nós, que já vivemos em um país onde o medo mora em todos os lugares, sabemos o que é sair de casa e não saber se iremos voltar, temos total noção do quão perigoso é estar nas mãos de bandidos e sermos prisioneiros em nossos lares. Mas Paris não, ela não estava acostumada com isso; nos 4 dias que estive por lá, vi pessoas atendendo celulares em todos os lugares, abrindo laptops no meio da calçada, contando dinheiro no meio da rua... Quanto tempo tem que não vejo isso na minha cidade? E, quando alguém arrisca algo assim, vem a expressão de reprovação e em seguida a frase: “Só pode ser gringo para se arriscar assim...”.

Eu não sei onde o mundo foi parar. Só sei, por experiência própria, que viver com medo é horrível e não desejo isso para Paris, nem para qualquer outra cidade do mundo.

Me espantei com tanta coisa depois desse acontecimento: me assustei com as pessoas nas redes sociais culpando os árabes imigrantes, logo aqui, em um país onde a grande maioria é descendente de imigrantes. Eu mesma não existiria se meu avô não tivesse sido acolhido aqui após a Segunda Guerra Mundial, então, como posso ter preconceito com outros povos? Me surpreendeu ver que algumas pessoas não gostaram de ver o mundo se compadecendo de Paris, porque, afinal, tem tanta desgraça no mundo e a gente não liga. Sério que a gente não liga? Quantas vezes falei sobre a Nigéria (e sobre suas mulheres sequestradas e estupradas) e meia dúzia de curtidas apareceu? Há quem ligue, mas também há quem não leia. Então, desculpe, a culpa não é de quem sofre com o próximo, mesmo ele estando distante. E se importar com Paris não me faz menos brasileira e compadecida com a tragédia em Mariana, mas entendo que locais turísticos retratados no mundo todo — e inclusive nos livros e filmes que amamos — talvez causem mais impacto.

Ninguém é menos importante, mas todos podem ajudar. Outro dia ouvi uma pessoa que admiro muito dizendo que a paz começa no condomínio em que vivemos, quando optamos por não brigar com nosso vizinho, e é verdade. Não podemos mudar o mundo todo, mas, se cada um mudasse a si mesmo, tendo atitudes positivas e mais humanas, o mundo poderia se contagiar com esse amor todo e parar de jorrar tanto ódio.


Paris sempre ficará no meu coração, assim como muitas cidades que visitei e amo de paixão. E isso não me faz menos brasileira. Isso só me faz humana. 

23 de nov. de 2015

Tons da Galera: Presentinhos de Natal

Essa semana o site Distractify fez um post muito legal com os 21 itens que qualquer amante dos livros amaria ter; como achei a cara do blog da Galera, resolvi compartilhar meus preferidos com vocês por aqui.



Da pashmina com mapa de Harry Potter, à legging de Emily Dickinson ao vestido to-di-nho Hamlet, a ideia é expressar seu amor pelos livros dos pés à cabeça! Pra quem é mais básica, vale a t-shirt de O grande Gatsby ou o colar de Apanhador no campo de centeio, no quesito fofura ganha o suéter “The winter is coming” e o prêmio mais artsy vai para a sapatilha Sylvia Plath.



Já para as fãs de mimos e delicadezas, não tem como não se apaixonar pelo bracelete de Drácula (“manchado” de sangue, claro), o de prata com verso de Sonho de uma noite de verão na parte interna, ou pela pulseira de penduricalhos de Os guardiões da galáxia. A melhor parte? Os objetos desejo são vendidos pelo site Etsy, ou seja, produção limitada de produtores pequenos bacanas e a maioria pode ser enviada para o Brasil. Aproveita que o Natal está logo ali, just sayin’...



E você? Andou vendo por aí alguma roupa ou acessório que poderia entrar nessa lista? Compartilha com a gente aqui nos comentários!

20 de nov. de 2015

Papos de Sexta: Empatia



Tinha planejado outra pauta para o “Papo de Sexta” desse mês, mas o que tenho visto nas redes sociais me fez mudar de ideia. Infelizmente, essa coluna será um pouco mais séria, mas acho que o momento pede essa pausa nos emoticons de sorrisos.

Segundo a definição do Dicionário Michaelis, empatia é “Na psicanálise, estado de espírito no qual uma pessoa se identifica com outra, presumindo sentir o que esta está sentindo”. Sentimos isso diariamente quando lemos certo? Acho que a empatia é o que nos cria o vínculo de identificação com personagens. Quem passou por bullying, entende o que Audrey narra em “À procura de Audrey”. Quem é autêntica e sofre um pouco com isso entende o que Sofia passa em “Perdida”. Quem já teve que assumir grandes responsabilidades mais cedo do que deveria, entende o que Will passa em “Métrica”. E esses são apenas alguns dos inúmeros exemplos que poderia citar falando superficialmente sobre o tema. 

Mas, quando tiramos a literatura da equação e voltamos nossa atenção para o mundo fora das páginas, o cenário muda. Infelizmente.

Desastres, tragédias, violência... Nosso mundo, nossa história é repleta disso. O problema é que parece que já nos acostumamos com isso. É considerado “normal” pessoas que moram em áreas de risco serem alvejadas por balas perdidas. É considerado “normal” pessoas no Oriente Médio viverem com medo por causa de homens-bomba. Mas deveria? Deveria ser normal não sentirmos empatia por seres humanos que não deveriam estar nessas condições, mas que sobrevivem a elas por não terem outra opção?

Aí um mar de lama arrasta o que vê pela frente em uma cidade no Brasil. Mar de lama esse que foi criado pelas mãos do homem, pela mineração, e que agora não arrasta dinheiro, mas vidas.

Aí extremistas distorcem uma fé e matam pessoas que nada tem a ver com a situação em uma das capitais mais famosas do mundo.

E no lugar de sentir empatia por ambos e fazer o possível para ajudar quem ficou por aqui, de entender o que causou ambas as tragédias, apontamos o dedo e julgamos quem sabe mais sobre o que aconteceu em Paris e menos sobre o que aconteceu em Mariana. Ou vice-versa.

O resultado é a criação de uma outra situação: a sinfonia de “mimimi” — ou melhor, de “MeMeMe” — nas redes sociais. Essas redes que deveriam conectar e compartilhar estão sendo usadas para julgar, ofender e propagar ódio. E esse ódio poderia ser evitado facilmente. Basta sentir empatia e ouvir o outro para entender e não apenas para responder.

Parece que as pessoas estão mais preocupadas em julgar a opinião alheia sobre um acontecimento e impor a sua, do que realmente se importar com o acontecimento em si. E isso é muito louco!

Longe de mim querer pregar alguma coisa, até porque tenho plena consciência de que faço menos do que deveria. Mas uma coisa eu aprendi: quando eu aponto um dedo, tenho os outros apontados pra mim.

A minha ideia com essa coluna foi pedir uma coisinha a todos que chegaram até aqui: empatia. Antes de bradar a própria opinião, se coloque no lugar do outro, entenda, reflita e aí sim forme a sua.

Hoje, com avanços tecnológicos que colocam incontáveis quantidades de informação na palma da nossa mão, nos dando a possibilidade de estar conectados com o mundo todo, todo tempo, fazemos o oposto. Ralhamos a torto e a direito sem fundamento e estamos cada vez mais desconectados com o que acontece ao nosso redor, do outro lado da nossa porta. O único brilho em nossos olhos vem das telas à nossa frente. 

Todos merecem o direito de se expressar e todos devem sim ter a própria opinião. Mas vamos tentar entender mais e odiar menos. Entender não é aceitar ou concordar. Entender é entender. E por mais que isso pareça simples, faz a maior diferença.



Chega de mascarar o preconceito e o julgamento com “ah, mas essa é minha opinião”. Opinião não é só gosto “prefiro o rosa ao roxo”. Opinião é utilizar argumentos e bom senso levando em consideração o outro e o contexto maior.

Então, antes de responder a pergunta do Facebook “No que você está pensando”, vamos realmente parar para pensar, refletir, antes de entrar no automático e somente repetir o “curte/comenta/compartilha”.

Mais empatia, por favor. Para todos nós e por todos nós!


19 de nov. de 2015

Galera entre letras: O Gato no Telhado e a Vaca no Brejo



Pois é. Eu falei pra vocês que esta semana o assunto ia ser o gato no telhado, mas pra fazer companhia ao bichano acabei chamando uma vaca!

Eu sei. A essa altura vocês devem achar que eu enlouqueci! Nada disso. O assunto é sério –- porque tradução SEMPRE é coisa séria, gente!

Eu acho que vocês nunca pararam pra pensar em quantas expressões no nosso idioma têm animais como seus protagonistas. Vejam só: deu zebra, cada macaco no seu galho, tirar o cavalo da chuva etc.
E cada expressão dessas tem um sentido bem definido. Quando dizemos, por exemplo, que “o gato subiu no telhado”, é pra avisar que vem notícia ruim pela frente ou mesmo que uma situação desagradável é inevitável, e se “a vaca foi pro brejo”, a coisa ficou feia mesmo e tempos difíceis vêm pela frente.

Mas nem sempre é fácil adaptar essas expressões para outros idiomas (e o inverso também é verdade). Imaginem, por exemplo, se a gente traduzir “a vaca foi pro brejo” literalmente — e um importante autor e tradutor brasileiro, Millôr Fernandes, fez isso por brincadeira; ficaria “the cow went to the swamp” e, para os falantes de língua inglesa, significaria apenas isso: uma vaca indo pro brejo — provavelmente, o animal ficaria atolado e precisaria de resgate. O sentido original da frase se perderia.

A melhor maneira de dizer que algo não está bem, que uma situação ruim é prevista, em inglês — e, ao mesmo tempo, manter ainda a referência a algum bichinho — é dizer que a situação “is going to the dogs”.

Se alguma coisa “vai ficar com os cachorros”, em inglês, já é considerada caso perdido. Aqui tem a explicação pra essa curiosa frase (que se originou na China antiga, vejam só!).

Outro dia eu me vi às voltas com a expressão “X has put Y out to pasture” num contexto mais ou menos negativo (alguém falava que não sabia se o produto Y tinha sido abandonado pela empresa X) e aí eu fiquei pensando como poderia passar essa ideia negativa contida na expressão que, literalmente, quer dizer: “X mandou Y pastar.”

E havia outro problema: em português, a gente usa a expressão “vai pastar!” quando chama outra pessoa de “burra” (justamente porque o que ruminantes fazem é pastar), portanto, a tradução literal estava fora de questão.

Eu tentei usar várias opções antes de “o gato subiu no telhado”, mas nenhuma se encaixou e a frase final ficou assim: “o gato de Y subiu no telhado de X”.

Nem sempre a gente encontra a maneira perfeita de transpor a ideia original para o nosso idioma, mas o importante é dar a chance ao leitor de tentar formar o sentido do que está escrito ali.

Por hoje é só. Leiam bastante e até!

Aviso importante: nenhum animal foi ferido durante a elaboração da coluna de hoje.

12 de nov. de 2015

Design et cetera: Outro dia, Trono de Vidro e o feminismo na literatura jovem


Nessas últimas semanas o feminismo ganhou destaque na mídia e nas redes sociais. Revoltadas com comentários pedófilos no Twitter  a respeito da participante do Masterchef, muitas mulheres corajosas começaram uma campanha online, compartilhando histórias de assédio. Além disso, teve o tema da redação do ENEM, focado na violência contra a mulher, que também gerou polêmica e trouxe o assunto à tona.

Enquanto isso, eu estava revisando o livro Outro dia, de David Levithan. O livro é voltado para o público jovem, e conta a história de amor entre Rhiannon e A, uma pessoa que troca de corpo todos os dias. A trama é narrada pela perspectiva da Rhiannon, que, aos 16 anos, encontra-se em uma relação abusiva com o namorado, Justin.

Justin está eternamente de mau humor e costuma ser verbalmente agressivo com ela. A garota anda pisando em ovos. Se isolou cada vez mais dos amigos. Se convenceu de que Justin, coitado, tem muitos problemas e é por isso que não consegue evitar ser agressivo com ela. Ele não é uma má pessoa, apenas alguém com dificuldade de controlar a raiva. E faz ela sofrer e pagar caro por estar ao seu lado.

Todos nós conhecemos um Justin. Algumas de nós já estivemos em relações assim. No entanto, um grande diferencial da narrativa de Outro dia é que nossa protagonista, ao conhecer A, percebe que ele é uma pessoa melhor, alguém que gosta dela de verdade e sabe trata-la bem.  Rhiannon escolhe A. Fim.

Parece tão simples, parece a escolha certa desde o princípio, e TODOS os livros para jovens deveriam passar essa mensagem. Entretanto, na qualidade de editora de YA, posso dizer que a grande maioria dos livros apresenta uma mensagem oposta:

1. Protagonista conhece Fulano

2. Fulano é um babaca e maltrata protagonista

3. Descobrimos que fulano é babaca por um “bom” motivo

4. O amor muda Fulano e ele vira um Príncipe

5. Protagonista e Fulano são felizes para sempre

Não estou exagerando. Pense na Bela e a Fera. 50 tons de Cinza. Crepúsculo. São muitas as histórias que perpetuam essa visão perversa sobre o amor e as relações. E nós, editores, temos que nos responsabilizar pelo que publicamos, principalmente nos selos jovens. Depois a gente se pergunta por que muitas mulheres crescem acreditando que vão mudar seus parceiros. Depois muita gente julga que “só apanha quem quer” e que “mulher que não se valoriza é sujeita a esse tipo de coisa”.

Mas enquanto os homens crescem inspirados no heroísmo do Super Homem e do Homem Aranha, a gente aprende que o final de toda história é o casamento: Branca de Neve, Cinderela, Princesa Adormecida. Culturalmente, as mulheres são ensinadas a competir entre si. A Cinderela tem que vencer a madrasta e as filhas dela. A Branca de Neve precisa escapar da bruxa má. A Bela Adormecida, coitada, está lá paralisada por outra bruxa invejosa, esperando desencalhar. A passividade é ensinada desde cedo e o machismo está mesmo nas pequenas coisas. Nos filmes da Disney que habitam nossa infância, nos livros que lemos enquanto jovens.

Mas aos poucos as coisas estão mudando. E nosso papel é participar ativamente dessa mudança, escolhendo títulos, estimulando o diálogo. Em 2013 lançamos a série Trono de Vidro, da Sarah J. Maas. Um livro de fantasia épica com uma protagonista forte que tem roubado corações, tanto dentro quanto fora da editora.



Eu nunca li nada como Trono de vidro e nunca conheci um personagem como a Celaena. Ela é uma assassina, tem seu próprio código de ética. Ela luta de igual para igual com homens e mulheres. Ela é frágil, claro, como todos somos em algum momento. Mas  a saga de Celaena não acaba com ela se apaixonando pelo homem ideal.

Não. Celaena se apaixona diversas vezes, mas isso de nada tem a ver com sua luta. Celaena não precisa da proteção do homem amado, pelo contrário, ela é quem o protege com unhas e dentes e lâminas afiadas. Afinal, se envolver com uma assassina desse tipo é extremamente perigoso para qualquer homem.

Quando, no meio da trama, aparece uma bela princesa estrangeira no reino, Celaena não a vê como rival. As duas forjam uma amizade sincera e lutam juntas contra inimigos comuns.

Parece algo muito trivial, né? Mas a jornada épica de Celaena, que já virou best-seller em mais de 40 países,  quebra com a ideia da mulher frágil que compete com a outra pelo amor e a proteção de algum príncipe aleatório. E essa quebra é muito necessária.

Para erradicar a violência doméstica, o assédio sexual e o silêncio a cerca disso, precisamos de mais histórias assim e mais heroínas como Celaena e Rhiannon.  Mulheres que falem: eu não aceito isso, vou atrás da minha felicidade, vou lutar por quem me valorize. Alguém que sofre, mas sabe se reinventar, se proteger. Uma mulher com a qual todas podem se identificar.

Rhiannon mostra que ao desistir do “amor” destrutivo, é possível encontrar um abraço que não vire golpe. E Celaena sintetiza toda a coragem, força e magnetismo que antes só era protagonizado por heróis masculinos.

Deve ser por isso que minha melhor amiga vai vestida de Celaena esse Halloween. Deve ser por isso que todas, desde minha sobrinha de 15 anos até a Dona Maria, copeira aqui da Record, amam essa série e não falam de outra coisa. 

#somostodasCelaena


9 de nov. de 2015

Tons da Galera: #HMBALMAINATION

Que ia ter histeria todo mundo sabia (quem não lembra daquele vídeo clássico numa liquidação de Alexander Wang em que de repente tudo ficou de graça?). A surpresa maior foi a globalização desta histeria verdadeiramente coletiva: Nova York, Dubai, Istambul, Paris — em quase todas as H&Ms do mundo o lançamento da coleção cápsula com a Balmain fez o aniversário recente de uma rede de supermercados carioca parecer brincadeira de criança.


Horas de desespero

Em Sidney, os consumistas esperaram horas debaixo de chuva. Paris vendeu tudo em menos de 3 horas. Em Londres, teve gente dormindo na porta da loja para um primeiro lugar na fila. A confusão foi tanta na hora de abertura de uma das filiais inglesas, que a polícia teve que fechar a loja. O site para compra virtual não aguentou a quantidade de acessos e saiu do ar, e filas dobraram quarteirões. Muitos fashionistas estavam ali para finalmente poderem ter uma pecinha da marca francesa. Porém, para muitos essa aventura já virou negócio: algumas horas depois um vestido que saía por 349 libras na loja estava no eBay sendo vendido por 6 mil libras com 19 lances já às quatro da tarde.

  
Como explicar? Olivier Rousteing, atual estilista da marca, é um gênio do marketing, e conseguiu, fazendo Kardashians e Gigis Hadids do Instagram usarem suas roupas e irem à suas festas, transformar a Balmain numa marca jovem e sonho de consumo. Muita gente torceu o nariz para tamanha modernização de uma marca antiga que vestia gente como Ava Gardner e Brigitte Bardot, mas a questão é que Olivier falou muito bem a língua que move essa indústria: a língua dinheiro, e ele não parece prestes a abandonar o barco – como fizeram Raf Simmons da Dior e Albert Elbaz, da Lanvin — tão cedo.


Balmain ontem e hoje.

5 de nov. de 2015

Galera entre letras: Sobre Calafrios e Gatos

Outro dia um leitor da coluna, Pedro, de 14 anos, que “devora os livros do Bernard Cornwell assim que eles saem”, me fez uma pergunta bem interessante, e eu resolvi respondê-la aqui no espaço.

O Pedro também gosta muito dos irmãos Grimm. Recentemente ele leu um conto chamado “O rapaz que não sentia calafrios” e ficou curioso com a quantidade de versões do título do conto — “O garoto destemido”, “O garoto corajoso”, “O rapaz que saiu de casa para saber o que era o medo”, “O garoto que não sabia o que era o medo”, e é provável que haja outras ainda.

Sempre que eu falo de traduções, eu chamo atenção para o fato de que a tradução é sempre UMA versão (entre muitas) de UM texto ORIGINAL. A tradução sempre é fruto do conhecimento do tradutor, além da época e do local onde ele vive. Por isso que a gente vê tantas traduções diferentes para um único texto original, o que não significa que uma seja melhor que a outra. Elas apenas são diferentes.

Mas voltando à pergunta do nosso amigo leitor, eu quis saber se a tradução que ele havia lido fora feita diretamente do alemão (a língua original dos contos dos irmãos Grimm) ou se tinha sido feita do inglês, ou seja, se era a tradução de uma tradução — ou tradução INDIRETA.

O Pedro ficou surpreso quando fiz a pergunta, porque ele achava que as traduções sempre eram do ORIGINAL. Aí eu expliquei que era comum que textos em idiomas considerados raros ou difíceis fossem traduzidos a partir de outro idioma. Isso costuma acontecer com línguas escandinavas, com o chinês etc., embora hoje a gente tenha ótimos tradutores nesses idiomas. Às vezes, acontece também de o próprio autor, seu agente ou editora sugerir a tradução INDIRETA.



No caso do conto dos Grimm, o texto tinha sido traduzido do inglês para o português, mas não fazia parte da versão mais famosa existente, as Household Stories, traduzidas por Lucy Crane e ilustradas por seu irmão, Walter Crane. [Aqui tem um link pra esta versão!]


Então eu resolvi procurar o texto ORIGINAL pra tirar a dúvida do Pedro em relação ao título da história. Mesmo que não haja versões certas ou erradas, talvez houvesse uma versão que se aproximava mais do sentido original do título da história.

Em alemão, o título diz o seguinte: “Märchen von Einem, der Auszog das Fürchten zu Lernen” ou (numa tradução literal): “Conto sobre Um Rapaz que Saiu de Casa para Aprender O Que Dá Medo”. Já deu pra perceber que “medo” aparece no título e que não tem muito a ver com coragem porque “corajoso” é quem sente medo e o supera. Na nossa história, o rapaz sequer conhece esse sentimento! E dá pra perceber também que, ao contrário da maioria dos títulos dos contos dos Grimm, esta história traz a palavra “conto” no próprio título, como se fosse um conto dentro de um conto!

Curiosamente, a palavra “medo” só vai aparecer mesmo no título. No restante do texto, a palavra usada é “Gruseln”, “aquilo que dá calafrios”.

Mas será que tudo que dá calafrios dá medo? Descobrir a resposta a essa pergunta é uma das graças da história!

E foi isso que eu expliquei ao Pedro, leitor curioso, e fã do Bernard Cornwell e dos irmãos Grimm.

[Infelizmente, eu não encontrei nenhuma edição em Domínio Público das obras dos irmãos Grimm em português, mas nas livrarias vocês encontram várias edições, inclusive das obras completas deles. Vale dar uma olhada neste conto pra entender o mistério dos calafrios!]

Mas… e os gatos do título do artigo?
Por ora, eu só posso dizer que o gato subiu no telhado… (risos)

Até a próxima e boas leituras!